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A evolução do direito de guarda

Ascom

Publicado no Jornal Estado de Minas no dia 8/10/1997

Vera Fischer, quem diria, está contribuindo para a evolução do Direito. Apesar da terrível invasão de sua privacidade, consciente ou inconscientemente, seu nome e sua imagem têm se prestado à discussão de um instigante tema do Direito de Família. Afinal, na tradição jurídica brasileira, guarda de filho é sempre com a mãe. Sempre acreditou-se em um “instinto materno”.

Numa concepção equivocada, e como grande sinal de atraso do nosso ordenamento jurídico, a Lei do Divórcio (nº 6.515/77) estabeleceu que o culpado da separação não terá direito à guarda dos filhos. Mas, afinal de contas: existe mesmo um culpado pelo desenlace conjugal?

Mesmo que se atribua a culpa a um dos cônjuges, ou conviventes, deveríamos indagar, se ao atrelar o mau ou bom exercício da função materna e paterna à conjugalidade não estaríamos incorrendo em um sério equívoco. Por exemplo, uma mulher pode ter sido uma péssima esposa e no entanto uma ótima mãe. Da mesma forma, o contrário: uma ótima esposa pode não ser uma boa mãe.

A discussão da guarda de filhos transcende muito as questões meramente jurídicas. Mesmo partindo do princípio que os filhos ficarão na companhia de quem melhor condições tiver para criá-los e educá-los, fica ainda a indagação: quem é essa pessoa? É o pai? A mãe, os avós? A resposta não é fácil e provavelmente muito angustiante para os julgadores. É que sabemos, hoje, com a Psicanálise, que as questões objetivas do Direito de Família estão permeadas por elementos que são da ordem da subjetividade. E mais: até que ponto é prejudicial aos filhos indagar-lhes com quem querem ficar, ou, a partir de qual idade eles poderão ser ouvidos pelo juiz?

Nessas discussões, aquele que acredita estar com a verdade sustenta sua razão atribuindo ao outro a culpa pelo fracasso da relação e conseqüentemente a incompetência. Não existe um culpado e um inocente, mas no meio desse fogo cruzado, os filhos muitas vezes são usados como moeda de troca do fim da conjugalidade. Mas é aí mesmo, no Judiciário, que são depositados os restos do amor. Alguns tribunais brasileiros já trabalham interdisciplinarmente com profissionais de psicologia e serviço social. É uma evolução! Aliás, é impensável atualmente a determinação de guarda de filhos sem a ajuda e intervenção destes profissionais. Será que na decisão do caso Vera Fischer, o Juízo do Rio de Janeiro serviu-se destes novos instrumentos que estão à disposição do Direito?

A mais recente evolução sobre esse assunto é a tentativa de se instalar no ordenamento jurídico brasileiro a modalidade da “guarda compartilhada”. Isto significaria que os filhos não ficariam nem com um, nem com outro, mas compartilhados entre os dois. Essa nova modalidade não foi ainda apreendida pelo ordenamento jurídico brasileiro. Não é simples a sua aplicação prática e em alguns casos nem mesmo é possível. Vencendo as resistências e melhor esclarecidos alguns pontos sobre esta nova possibilidade, estaremos dando um passo adiante para a evolução e necessária reforma do Direito de Família.

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