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Tabus sobre sexo na maturidade acentuam discriminação às pessoas idosas

Ascom

Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM

A sexualidade na maturidade ainda é um tabu. A negligência sobre o tema, além de revelar como as pessoas idosas ainda são tratadas na nossa sociedade, resulta em uma série de prejuízos a essa população, marcada pela fragilidade de direitos e ainda vítima de variadas formas de discriminação. A afetividade parece ser um privilégio exclusivo da juventude, ao passo em que se faz presente durante toda a vida.

Gilda, de 78 anos, Sônia, de 82, e Helena, de 92, são Avós da Razão. Em um canal no YouTube, as três amigas que se conhecem há mais de 50 anos respondem variadas perguntas dos internautas com senso de humor ácido e inteligente. O objetivo é afastar o estereótipo de “vovó” das histórias infantis.

“Nós fomos motivadas a criar nosso canal não só para rebater estereótipos em relação às avós, mas para rever preconceitos quanto aos velhos em geral, preconceitos que são manifestados não só pelos mais jovens, mas muitas vezes pelo próprio velho contra si mesmo”, conta Gilda.

Elas não se furtam dos assuntos mais polêmicos. Depressão, poliamor, preconceito e relacionamentos abusivos estão entre as abordagens recentes. Sexo, é claro, aparece com frequência entre as indagações dos seguidores. “A sexualidade sempre desperta interesse geral, principalmente quando é tratado por três velhas que respondem sem tabus, objetivamente e de maneira leve e descontraída”, detalha Gilda.

Sexo é saudável em qualquer tempo

Para Helena, a vida sexual não acaba nunca. Ela, que engatou um namoro após os 80, acredita que a sexualidade vai além do simples ato sexual. “O ato sexual só mecânico é horrível. Tem que haver alguma coisa cerebral no meio também, envolvendo a afetividade”, opina.

O tabu em relação ao sexo após os 60 anos persiste por conta do preconceito, segundo Helena: “Acham que velho é para ficar guardado embaixo do armário”. Gilda acrescenta que cada um reage à sua maneira em relação ao sexo ao longo da vida, inclusive quando chega à maturidade. “Depende muito da pessoa, pois cada um tem sua maneira desde quando era jovem de como lidava com sua sexualidade”, avalia.

“Para alguns, o sexo passa a ser mais eventual, já não tem a mesma importância de quando os hormônios estavam superativos. Mas a verdade é que o sexo tem de ser cultivado, independentemente da idade ou da situação, porque é saudável em qualquer tempo”, diz Gilda.

À frente do Avós da Razão, o trio busca dialogar especialmente com pessoas de sua faixa etária. “Nossa intenção é fazer com que as pessoas mais velhas, das nossas gerações, olhem a vida com mais abertura, naturalidade, em todos os aspectos e também em relação ao sexo”, define Gilda.

“Dizemos a essas pessoas, que sejam menos conservadoras e que se esforcem para entender esse novo tempo. O sexo é saudável e deve ser olhado com naturalidade. Queremos quebrar esses tabus e conscientizar as pessoas mais velhas a não terem preconceito. Olhar sempre para frente e se inserir no presente com suas mudanças”, frisa.

Conheça o canal Avós da Razão, no YouTube:

Preconceitos a serem vencidos

O advogado Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, afirma que o preconceito em relação à sexualidade fora da faixa etária da juventude deve ser afastado. Afinal, pessoas com mais de 60 anos podem ter uma vida sexual plena e ativa, algo que a legislação brasileira ainda não abarca, segundo o jurista.

“Apesar de a Lei 8.842/1994, que dispõe sobre a Política Nacional do Idoso, e do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003) serem textos normativos modernos, politicamente corretos e que vêm para resgatar a dignidade das pessoas da chamada terceira idade, ainda há preconceitos a serem vencidos”, observa Rodrigo.

O primeiro deles, de acordo com o advogado é o flagrante equívoco da concepção sobre a sexualidade. “Talvez a falta de visibilidade nesta sociedade excludente esteja no fato de que as pessoas com mais de 60 anos já não fazem parte da engrenagem da produção política e econômica.”

Incidência de HIV cresceu entre os mais velhos

“Em uma sociedade excludente, em que se cultua o corpo jovem, as pessoas com mais de 60 anos são esquecidas pelo poder público em suas campanhas de saúde para combater a AIDS. Toda sua propaganda de prevenção é dirigida a um público jovem, como se as pessoas mais velhas não tivessem sexualidade”, exemplifica o presidente do IBDFAM.

Em 2018, o preconceito em se tratar do tema foi apontado como um dos fatores para o aumento da incidência do vírus HIV entre os mais velhos. Os dados alarmantes foram divulgados pelo Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde. Faltam, segundo Rodrigo, campanhas efetivas de prevenção de doenças sexualmente transmissíveis que não sejam restritas aos jovens.

“Enquanto houver desejo haverá vida, enquanto houver vida haverá sexualidade. Ela pode até sofrer variações e adaptações em razão das mudanças do corpo, mas só se extingue com a vida. Até porque é a energia vital que nos faz produzir, trabalhar, chorar, ter alegria, enfim, é a energia libidinal que faz movimentar a vida, expressando-se de várias maneiras, seja por meio do trabalho e de outras formas, e também pelo ato sexual”, defende Rodrigo.

Segundo o jurista, “para não virar letra morta”, o Estatuto do Idoso deve atender a esses fatores. “Precisa ser efetivamente implementado e fazer parte das políticas públicas, gerando respeito e dignidade a essas pessoas que, de certa forma, já deram sua parcela de contribuição à sociedade, mas que ainda carregam consigo a energia vital e podem contribuir para que tenhamos uma sociedade mais justa e solidária. É preciso, portanto, atribuir-lhes um lugar de sujeito de direito e de desejo para saírem da invisibilidade social”, conclui Rodrigo da Cunha Pereira.

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