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TJMG: Testamento e o Regime de bens

Ascom

(…) “O fato de o regime de bens do casamento do de cujus ter sido o da separação obrigatória de bens não impede o reconhecimento à viúva de direitos hereditários, porque “quando o cônjuge é chamado a suceder, assume a condição de herdeiro, independentemente do regime de bens do casamento, pois a lei nada refere ao conferir-lhe a qualidade de herdeiro necessário” (Maria Berenice Dias).” (…)

EMENTA: COEXISTÊNCIA DE TESTAMENTO E CÔNJUGE SOBREVIVENTE – CASAMENTO REALIZADO SOB O REGIME DA SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS (ART. 1641, II, CC)- SÚMULA 377 DO STF – POSSIBILIDADE – PRESUNÇÃO DO ESFORÇO EM COMUM DO CASAL – DIREITO REAL DE HABITAÇÃO – EXISTÊNCIA DE MAIS DE UM IMÓVEL RESIDENCIAL – POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO, ADEMAIS EM RELAÇÃO AO IMÓVEL DE RESIDÊNCIA DA VIÚVA MEEIRA. O disposto na Súmula 377 do STF vem sendo largamente aplicado e estendido, em qualquer que seja o regime de bens do casamento, sendo presumido o esforço comum. O fato de haver outros bens residenciais no Espólio, ainda não partilhados, não resulta exclusão do direito de habitação

V.V EMENTA: INVENTÁRIO – SUCESSÃO MISTA – COEXISTÊNCIA DE TESTAMENTO E CÔNJUGE SOBREVIVENTE – CASAMENTO REALIZADO SOB O REGIME DA SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS (ART. 1641, II, CC)- SÚMULA 377 DO STF – INTELIGÊNCIA – EXIGÊNCIA DA PROVA DO ESFORÇO COMUM PARA A COMUNICABILIDADE DOS AQUESTOS – AUSÊNCIA NO CASO – INEXISTÊNCIA DO DIREITO DE MEAÇÃO. TESTAMENTO PARTICULAR ELABORADO ANTES DO CASAMENTO DO TESTADOR – DISPOSIÇÃO QUE ABRANGIA A TOTALIDADE DO PATRIMÔNIO DO DE CUJUS – CADUCIDADE – INOCORRÊNCIA – MERA REDUÇÃO DO TESTAMENTO ATÉ O LIMITE DA PARTE DISPONÍVEL – ART. 1.967 DO CC – DIREITO DE LEGÍTIMA ASSEGURADO À VIÚVA, HERDEIRA NECESSÁRIA. DIREITO REAL DE HABITAÇÃO – EXISTÊNCIA DE MAIS UM IMÓVEL INVENTARIANDO DE NATUREZA RESIDENCIAL – IMÓVEL QUE, ALÉM DO MAIS, NÃO SERVIA DE RESIDÊNCIA DA FAMÍLIA.

– A lei que regula o regime de bens é a da data da celebração do casamento, visto que, nos termos do art. 1.639, § 1º, do Código Civil, “o regime de bens entre os cônjuges começa a vigorar desde a data do casamento”. Adotar a data da morte como parâmetro de aferição do direito aplicável seria admitir a incidência retroativa de um regime diferente daquele conhecido pelos nubentes, em violação do ato jurídico perfeito e do princípio da segurança jurídica

– Se o casamento foi realizado sob o regime da separação obrigatória de bens, sem qualquer objeção dos nubentes enquanto vigorou, não pode o cônjuge sobrevivente, depois de já extinto o matrimônio pela morte do varão, pretender transmudar, com efeito retroativo, o regime de bens para o da comunhão parcial, alegando a inconstitucionalidade do art. 1.641, II, do CC, ainda vigente no direito positivo. A hipótese feriria os mais elementares princípios da ordem constitucional.

– Em que pese a existência de entendimento em sentido contrário, a interpretação que se faz do Enunciado 377 da Súmula do STF é no sentido que a prova da comunhão de esforços é imprescindível para a comunicabilidade dos bens adquiridos onerosamente depois do casamento, pois, caso contrário, os efeitos do regime da separação legal de bens tornar-se-iam idênticos aos do regime da comunhão parcial, em desvirtuamento da opção legislativa, bem como porque tal orientação é a que melhor se compatibiliza com o escopo de impedir o enriquecimento ilícito de um dos consortes em detrimento do outro – o qual norteou a edição da referida súmula.

– O fato de o regime de bens do casamento do de cujus ter sido o da separação obrigatória de bens não impede o reconhecimento à viúva de direitos hereditários, porque “quando o cônjuge é chamado a suceder, assume a condição de herdeiro, independentemente do regime de bens do casamento, pois a lei nada refere ao conferir-lhe a qualidade de herdeiro necessário” (Maria Berenice Dias).

– No caso em que o de cujus, solteiro e sem ascendentes nem descendentes, redige testamento particular deixando todo o seu patrimônio a uma irmã, e, posteriormente, vem a se casar, não ocorre a caducidade do testamento, cujas causas estão previstas taxativamente nos artigos 1.973 e 1.974 do Código Civil, mas apenas a redução das liberalidades até o montante da porção disponível, assegurando-se, assim, o direito do cônjuge à legítima, na condição de herdeiro necessário.

– O direito real de habitação só será assegurado ao cônjuge sobrevivente em relação ao imóvel destinado à residência da família, e desde que seja o único dessa natureza a inventariar.

AGRAVO DE INSTRUMENTO CV Nº 1.0024.12.282459-2/002 – COMARCA DE BELO HORIZONTE – AGRAVANTE (S): PAULA VILELA RAMOS – AGRAVADO (A)(S): ESPOLIO DE LUIZ AUGUSTO MARTINS DE SA RAMOS REPDO (A) PELO (A) INVENTARIANTE LÚCIO MARTINS DE SÁ RAMOS – INTERESSADO: LUIZA RAMOS SCHETTINO, MARIA MARTINS RAMOS, MÔNICA MARTINS DE SÁ RAMOS, LUCIANO MARTINS DE SÁ RAMOS

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 1ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO, VENCIDO EM PARTE O RELATOR.

DES. EDUARDO ANDRADE

RELATOR.

DES. EDUARDO ANDRADE V O T O

Trata-se de agravo de instrumento (‘/001’) interposto por Lúcio Martins de Sá Ramos, inventariante do espólio de Luiz Augusto de Sá Ramos, em face da decisão proferida nos autos do respectivo inventário, que determinou a intimação do inventariante para juntar aos autos certidão de isenção/quitação de ITCD, bem como para apresentar novo esboço de partilha, em que a viúva, Paula Vilela de Sá Ramos, seja contemplada, na condição de herdeira necessária – e não meeira -, com toda a parte indisponível dos bens deixados pelo falecido marido, à luz dos artigos 1687, 1688 e 1838, todos do Código Civil, remanescendo à irmã-legatária apenas a metade do acervo, consubstanciada na parte disponível da herança.

O agravante pretende a reforma da decisão, ao argumento de que, em tendo a agravada se casado com o de cujus pelo regime da separação legal de bens, jamais pode ser considerada herdeira, sob pena de se malferir a vontade livre manifestada pelo cônjuge quando em vida, bem como que, no caso, o falecido deixou testamento particular, lavrado antes de se casar e já confirmado por sentença transitada em julgado, pelo qual deferiu a integralidade dos seus bens à irmã Mônica, o que deve, portanto, ser respeitado.

Às fls. 33-v (agravo ‘/001’), indeferi o pedido de concessão de efeito suspensivo.

Devidamente intimada, a agravada apresentou resposta ao recurso às fls. 37/55 (agravo ‘/001’),, TJ, arguindo, preliminarmente, a sua extemporaneidade, por prematuro, o patrocínio infiel do advogado do agravante e a ilegitimidade deste para recorrer em nome próprio, e não na representação do espólio. No mérito, pediu pelo desprovimento do agravo.

Depois da interposição do agravo pelo inventariante, a parte contrária, viúva do de cujus, opôs embargos declaratórios em face da r. decisão, os quais foram parcialmente acolhidos pelo i. Magistrado a quo, nos seguintes termos:

“… dou parcial provimento aos embargos de declaração de fls. 304/310 somente para reconhecer o direito real de habitação da embargante do imóvel localizado na Rua Patagônia, n.º 1.023, apto 1104, bairro Sion, nesta Capital.”(fls. 254, TJ, agravo ‘/001’).

Ato contínuo, o agravante ratificou as razões de fls. 02/09, TJ, e, em acréscimo, se insurgiu contra o reconhecimento do direito real de habitação à agravada, alegando que existem quatro imóveis residenciais já inventariados, o que afasta, nos termos da lei, o referido direito à viúva. (fls. 257, TJ, agravo ‘/001’).

Concedida vista à agravada, sobreveio a manifestação de fls. 266/275 (agravo ‘/001’), em que reitera as preliminares de não conhecimento do recurso, por extemporaneidade e patrocínio infiel do advogado subscritor, pugna pela aplicação de multa por litigância de má-fé ao agravante, e pelo desprovimento do agravo, no mérito.

Posteriormente à publicação do julgamento dos embargos declaratórios, a viúva, Paula Vilela de Sá Ramos, também interpôs agravo de instrumento, sequencial ‘/002’, pretendendo a reforma parcial da decisão, para se reconhecer a sua habilitação na ação de inventário como única herdeira necessária a título universal e meeira de todos os bens deixados pelo falecido marido, mantendo-se o direito real de habitação já deferido. Alega, em resumo, que: o último ato civil do falecido foi o seu casamento, posterior à elaboração do testamento, sendo forçoso concluir que a sua vontade foi falecer casado, deixando como única herdeira necessária a esposa; que a existência de herdeiro necessário na data da morte enseja a caducidade do testamento, redigido antes do casamento, por inteligência dos artigos 1973 e 1974 do CC; que, na eventualidade de se reconhecer eficaz o testamento, deve-se dividir o que foi testado em duas partes, deferindo metade à irmã legatária, e atribuir a si todo o restante, consistente na metade do acervo existente ao tempo do testamento e no patrimônio adquirido posteriormente ao ato de vontade; que, embora o regime do casamento tenha sido o da separação legal de bens, por imposição do então vigente artigo 1641 do CC, deve-se considerar a lei do tempo da morte, que elevou a idade da separação obrigatória de bens para 70 anos, podendo-se concluir, assim, que se o nubente tinha menos de 70 anos quando do casamento, o regime de bens a prevalecer na hipótese, para efeitos sucessórios, é o da comunhão parcial; que, não fosse por isso, o art. 1641, II, do CC, é flagrantemente inconstitucional, por violar o princípio da dignidade da pessoa humana, conforme reconhecido pela doutrina e jurisprudência pátrias; que é também meeira de todos os bens adquiridos onerosamente durante o casamento, em aplicação da Súmula 377 do STF, que estabelece hipótese de presunção de esforço comum.

Às fls. 382-v (agravo ‘/002’), indeferi o pedido de concessão de efeito suspensivo e de tutela antecipada recursal.

A agravante formulou pedido de reconsideração às fls. 385/390 (agravo ‘/002’).

Devidamente intimado, o agravado respondeu ao recurso às fls. 392/399 (agravo ‘/002’), pugnando pelo seu desprovimento.

Designado relator eventual do agravo, em virtude do meu período de licença e férias regulamentares, o eminente Des. GERALDO AUGUSTO apreciou o pedido de reconsideração formulado pela agravante e conferiu parcial efeito suspensivo ao recurso, para obstar momentaneamente os efeitos da decisão agravada na parte em que determinara a intimação do inventariante para, no prazo de 30, juntar aos autos certidão de quitação/isenção do ITCD retificador, bem como para apresentar novo esboço de partilha. (fls. 404/405-v, agravo ‘/002’)

Os autos dos agravos ‘/001’ e ‘/002’ foram apensados, dada a evidente conexão.

Vieram-me ambos conclusos.

Procedo ao julgamento conjunto dos agravos, por se referirem a uma mesma decisão.

PRELIMINARES

1. NÃO CONHECIMENTO POR EXTEMPORANEIDADE

A agravada argui, preliminarmente, inadmissibilidade do agravo, com amparo no Enunciado 418 da Súmula do STJ, porquanto fora interposto antes da publicação da decisão dos embargos declaratórios e, quando da ratificação das razões, o agravante fez incluir novo pedido de reforma, relacionado ao direito real de habitação reconhecido à agravada naquela decisão.

A preliminar não prospera, data venia.

Como reconhece a própria agravada, em que pese o agravo tenha sido interposto antes da publicação da decisão dos embargos, houve oportuna ratificação das razões, o que afasta a incidência da Súmula invocada, que trata da hipótese de recurso prematuro sem posterior ratificação.

E quanto ao fato de o agravante ter aditado o seu recurso, para incluir pedido de reforma do reconhecimento do direito real de habitação à agravada, nenhuma irregularidade há nesse tocante, vez que esta matéria representa, exatamente, o âmbito de alcance do efeito modificativo atribuído aos embargos declaratórios, os quais, acolhidos parcialmente, promoveram a integração da decisão originária. Logo, acrescido tal capítulo ao decisum, tornou-se lícito ao recorrente se insurgir contra o novo provimento, ainda não atingido pela preclusão.

Caso os embargos houvessem sido rejeitados é que o agravante não poderia ampliar objetivamente o seu recurso, porquanto já estaria superado o momento oportuno para a impugnação da decisão, mantida incólume. No entanto, no caso vertente, era lícito o aditamento realizado, sendo certo que à parte agravada foi dado o direito de se manifestar sobre o acréscimo, sem qualquer prejuízo, destarte, ao seu direito ao contraditório.

A respeito do tema, vale destacar a doutrina de FREDIE DIDIER JR. e LEONARDO JOSÉ CARNEIRO DA CUNHA:

“… opostos embargos declaratórios por uma parte, o prazo para interposição de outro recurso, por qualquer das partes, interrompeu-se. Quem, porém, já interpôs seu recurso, não poderá fazê-lo novamente, não obstante a reabertura do prazo a partir do julgamento dos declaratórios. Isso porque já praticou o ato processual, caracterizando a chamada preclusão consumativa. Vale ressalvar, apenas, a hipótese de, nos embargos de declaração, haver modificação da decisão, sendo, então, possível à parte que já recorreu aditar seu recurso relativamente ao trecho da decisão embargada que veio a ser alterado. É o que se extrai do” princípio “da complementaridade.” (Curso de Direito Processual Civil, v3. Salvador: Jus Podivm, 2011, p. 212)

Rejeito, assim, a preliminar.

2. NÃO CONHECIMENTO POR IRREGULARIDADE DE REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL

Em sede preliminar, a agravada também pugna pelo não conhecimento do recurso, porque os procuradores que o subscrevem estão a infringir o Código de Ética e Disciplina da OAB e a incorrer em patrocínio infiel, ao formularem pretensão contrária os seus interesses, quando, ainda há pouco, eram os seus advogados nos autos.

Data venia, a preliminar não merece acolhida.

Isso porque, sem adentrar, aqui, no aspecto da regularidade do ato para os efeitos disciplinares e penais – o que poderá, se for de interesse da agravada, ser discutido nos âmbitos próprios -, certo é que não houve defesa simultânea de interesses antagônicos, a comprometer a validade da peça subscrita pelos advogados do agravante, vez que, antes da interposição deste recurso, a agravada já havia revogado o mandato outrora outorgado aos referidos profissionais, bem como porque, no específico caso em exame, a circunstância de a agravada ter passado a integrar o pólo oposto na lide resultou de ordem do próprio juízo (fls. 58, TJ, agravo ‘/001’), tornando inevitável, assim, que os advogados dos requerentes passassem a demandar no sentido contrário dos seus interesses.

Para se escapar dessa situação, a única alternativa seria que os advogados do espólio e dos demais herdeiros renunciassem ao mandato por estes lhe outorgado e se afastassem completamente do patrocínio causa – o que, certamente, não era razoável exigir -, já que, com a habilitação superveniente da viúva na condição de herdeira, estabeleceu-se uma nova conformação processual. Igualmente, não era possível exigir a observância da quarentena, haja vista que tudo ocorreu dentro do mesmo processo, por ordem do juízo.

Logo, não vejo como tais alegações possam comprometer a higidez da representação processual dos agravantes, ao menos no âmbito deste processo.

E, por oportuno, afasta-se desde já o pleito de condenação do agravante às penas por litigância de má-fé, porque, evidentemente, as consequências de eventual cometimento de infração disciplinar pelos advogados, em desacordo com o Estatuto da Advocacia, não podem ser suportadas pelo cliente, parte no processo. Não há, portanto, embasamento legal ao referido pedido, data venia.

Rejeito, nesses termos, a segunda preliminar.

3. ILEGITIMIDADE DO AGRAVANTE

A agravada alega, ainda, a falta de ilegitimidade do agravante, porque recorreu em nome próprio, e não na condição de inventariante, representando o espólio.

No entanto, em que pese a falta de técnica na redação do preâmbulo do recurso, verifica-se que, logo ao início da narrativa, o agravante se identificou inventariante do espólio, daí porque, em não tendo havido qualquer prejuízo à defesa da agravada por conta desse pormenor, conclui-se ter havido mera irregularidade, sem repercussão no âmbito da validade do ato.

Rejeito a terceira preliminar.

MÉRITO

Conheço dos recursos, presentes os pressupostos de admissibilidade.

A questão em exame consiste em estabelecer a maneira correta de divisão da herança de Luiz Augusto de Sá Ramos, segundo as especificidades do caso concreto e as normas que regem a sucessão, bem como definir a existência ou não do direito real de habitação postulado pela viúva.

Em breve digressão dos fatos, tem-se que o de cujus redigiu testamento particular em 11/02/2009 – à época solteiro, sem ascendentes nem descendentes -, instituindo a irmã Mônica Martins de Sá Ramos como herdeira de todos os seus bens móveis, imóveis e de suas disponibilidades financeiras. No entanto, em 14/08/2009, quando contava com 63 anos de idade, veio a contrair matrimônio, pelo regime da separação legal de bens, com Paula Vilela Ramos, com quem permaneceu casado até a sua morte, ocorrida em 23/08/2012.

Diante disso, o inventariante do espólio, um dos filhos do de cujus, defende que a disposição testamentária há ser cumprida integralmente, deferindo-se a totalidade da herança a Mônica Martins de Sá Ramos, ao argumento de que deve prevalecer a vontade livremente manifestada pelo falecido, não podendo a viúva, com quem era casado pelo regime da separação absoluta de bens, obter direito sucessório sobre os seus bens, sob pena de incompatibilidade entre os artigos 1829 e 1687 do Código Civil. A título subsidiário, admite seja reconhecido a Paula Vilela Ramos algum direito sobre os bens adquiridos na constância do casamento. Por fim, não se conforma com o reconhecimento do direito real de habitação à mesma, por não ser o imóvel o único de natureza residencial integrante do inventário.

A viúva, por sua vez, sustenta a caducidade do testamento, pelo fato de o casamento ter sobrevindo à sua confecção, o que tornaria incompatível o ato de disposição da totalidade dos bens a um colateral com a existência de uma herdeira necessária. Assim, invocando a ordem legal de vocação hereditária, defende ser a herdeira universal dos bens do falecido esposo, além de meeira de todos os bens adquiridos onerosamente na constância do matrimônio, segundo teor da Súmula 377 do STF.

Na decisão agravada, integrada pelo julgamento dos embargos declaratórios, o i. Magistrado a quo entendeu que a viúva não possui direito de meação, porquanto a comunicabilidade dos bens adquiridos depois do casamento, estabelecida na Súmula 377 do STF, pressupõe a prova do esforço comum – ausente na espécie -, e, quanto à herança, decidiu pela prevalência do testamento até o limite em que não compromete o direito de legítima da viúva, isto é, determinou que a parte indisponível do acervo hereditário seja deferida à herdeira necessária. Reconheceu à segunda agravante, também, o direito real de habitação no imóvel situado na Rua Patagônia, 1023, ap 1104, bairro Sion, nesta capital.

Pois bem.

Após minucioso estudo do caso, concluo, não obstante o esforço argumentativo dos combativos procuradores das partes, que a decisão do i. Juiz a quo deve ser mantida integralmente, no tocante à definição dos direitos sucessórios.

Começo pela análise do direito de meação, porque seu eventual reconhecimento repercute na quantificação da herança e, por conseguinte, na apuração da legítima – que também seja objeto de exame em separado.

Conforme acima relatado, Paula Vilela Ramos casou-se com o de cujus em 14/08/2009, sob o regime da separação legal de bens, em observância ao artigo 1.641, II, do Código Civil, que, à época, estabelecia a obrigatoriedade do referido regime no casamento da pessoa maior de 60 anos de idade.

A primeira tese da agravante Paula Vilela Ramos orienta-se no sentido de que, em tendo a Lei nº 12.344, de 2010, vigente ao tempo da morte do de cujus, elevado o referido limite etário para 70 anos, e considerando que, à época do casamento, o seu marido contava com idade inferior a 70, é de se concluir que o regime de bens do seu casamento era da comunhão parcial, para efeitos sucessórios (fls. 12, agravo ‘/002’).

A tese é manifestamente insubsistente, data venia, porquanto a lei que regula o regime de bens aplicável é a da data da celebração do casamento, eis que “o regime de bens entre os cônjuges começa a vigorar desde a data do casamento” (art. 1.639, § 1º, CC). Adotar a data da morte como parâmetro de aferição do direito aplicável – conforme pretendido pela agravante – seria admitir a aplicação retroativa de um regime diferente daquele conhecido pelos nubentes, em violação ao ato jurídico perfeito e ao princípio da segurança jurídica.

Igualmente improcedente o argumento da viúva de que o regime da separação obrigatória de bens não poderia prevalecer, por ser o art. 1.641, II, do CC, inconstitucional. Ora, não se desconhece a existência de sólida corrente doutrinária e jurisprudencial no sentido da incompatibilidade da referida regra com a Constituição; no entanto, disso não resulta, em hipótese alguma, que possa o cônjuge sobrevivente, fundado na inconstitucionalidade de norma ainda plenamente vigente, pretender transmudar, com efeito retroativo, o regime de bens que vigorou ao longo seu casamento – sem qualquer objeção por parte dos cônjuges, vale dizer -, depois de já extinto pela morte do varão. A hipótese feriria os mais elementares princípios da ordem constitucional.

Logo, é indesviável que o regime de bens do casamento em questão é o da separação legal de bens.

Dito isso, faz-se oportuno destacar o teor do Enunciado 377 da Súmula do STF:

“No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento.”

A interpretação do referido enunciado, como se sabe, é fonte de acirrada controvérsia no âmbito da doutrina e jurisprudência, inclusive dos tribunais superiores.

Reconhece-se a relevância dos argumentos que sustentam a tese da presunção do esforço comum para efeito de comunicação dos aquestos, a dispensar a prova do fato. No entanto, este relator, em nova reflexão acerca da matéria, acolhe a orientação de que a prova da comunhão de esforços é imprescindível para que haja comunicabilidade dos bens adquiridos onerosamente depois do casamento, caso contrário os efeitos do regime da separação legal de bens tornar-se-iam idênticos aos do regime da comunhão parcial, em nítido desvirtuamento da opção legislativa. Como bem colocou a eminente Des. ÁUREA BRASIL, no julgamento da apelação cível 1.0045.01.001291-7/001, “não é lícito ao intérprete equiparar institutos que o próprio legislador fez questão de distinguir”.

Além disso, o entendimento que ora se defende é que melhor se compatibiliza com o escopo de impedir o enriquecimento ilícito de um dos consortes em detrimento do outro – o qual, ressalte-se, norteou a edição da súmula em análise -, pois, deste modo, preserva-se na partilha a proporção havida na aquisição, evitando-se injustiças.

Nesse sentido, os seguintes precedentes do Superior Tribunal de Justiça:

DIREITO DE FAMÍLIA. UNIÃO ESTÁVEL. COMPANHEIRO SEXAGENÁRIO.

SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS. ART. 258, § ÚNICO, INCISO II, DO CÓDIGO CIVIL DE 1916.

1. Por força do art. 258, § único, inciso II, do Código Civil de 1916 (equivalente, em parte, ao art. 1.641, inciso II, do Código Civil de 2002), ao casamento de sexagenário, se homem, ou cinquentenária, se mulher, é imposto o regime de separação obrigatória de bens. Por esse motivo, às uniões estáveis é aplicável a mesma regra, impondo-se seja observado o regime de separação obrigatória, sendo o homem maior de sessenta anos ou mulher maior de cinquenta.

2. Nesse passo, apenas os bens adquiridos na constância da união estável, e desde que comprovado o esforço comum, devem ser amealhados pela companheira, nos termos da Súmula n.º 377 do STF.

3. Recurso especial provido.

(REsp 646.259/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 22/06/2010, DJe 24/08/2010)

CIVIL. REGIME DE BENS. SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA. AQÜESTOS. ESFORÇO COMUM. COMUNHÃO. SÚMULA 377/STF. INCIDÊNCIA.

1. No regime da separação legal de bens comunicam-se os adquiridos na constância do casamento pelo esforço comum dos cônjuges (art. 259 CC/1916).

2. Precedentes.

3. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 442629/RJ, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 02/09/2003, DJ 15/09/2003, p. 324, REPDJ 17/11/2003, p. 332)

DIREITO DE FAMÍLIA. REGIME DA SEPARAÇÃO LEGAL DE BENS. AQUESTOS. ESFORÇO COMUM. COMUNICABILIDADE. SUMULA STF, ENUNCIADO N. 377. CORRENTES. CÓDIGO CIVIL, ARTS. 258/259. RECURSO INACOLHIDO.

I – EM SE TRATANDO DE REGIME DE SEPARAÇÃO OBRIGATORIA (CÓDIGO CIVIL, ART. 258), COMUNICAM-SE OS BENS ADQUIRIDOS NA CONSTANCIA DO CASAMENTO PELO ESFORÇO COMUM. II – O ENUNCIADO N. 377 DA SUMULA STF DEVE RESTRINGIR-SE AOS AQUESTOS RESULTANTES DA CONJUGAÇÃO DE ESFORÇOS DO CASAL, EM EXEGESE QUE SE AFEIÇOA A EVOLUÇÃO DO PENSAMENTO JURÍDICO E REPUDIA O ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA.

III – NO AMBITO DO RECURSO ESPECIAL NÃO E ADMISSIVEL A APRECIAÇÃO DA MATERIA FATICA ESTABELECIDA NAS INSTANCIAS LOCAIS. (REsp 9938/SP, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 09/06/1992, DJ 03/08/1992, p. 11321)

Nessa perspectiva, na ausência de prova do esforço comum para a aquisição do patrimônio em nome do falecido que sobreveio ao casamento, não há como se reconhecer à agravante o direito de meação, data venia. Confirma-se, assim, a decisão recorrida, nesse particular.

Avança-se, então, à sucessão testamentária.

Conforme já colocado, Luiz Augusto deixou testamento particular, beneficiando uma de suas irmãs com a totalidade do seu patrimônio. No entanto, o de cujus veio a se casar posteriormente, sobrevindo, assim, herdeira necessária ao testador – a viúva, ora segunda agravante.

A respeito do tema, dispõe o Código Civil:

Art. 1.845. São herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge.

Art. 1.846. Pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança, constituindo a legítima.

O primeiro agravante alega que, por ter sido o casamento celebrado pelo regime da separação legal absoluta, não se pode reconhecer à viúva qualquer direito sucessório em relação aos bens deixados pelo falecido marido, daí porque a vontade manifestada no testamento deve prevalecer na íntegra. A segunda agravante afirma, por sua vez, que o testamento caducou, pelo fato de existir herdeiro necessário na data da morte, não existente ao tempo da sua redação. Defende a completa ineficácia da disposição de vontade.

A solução adequada, a meu ver, é aquela determinada pelo i. Magistrado, que atende a uma parcela de cada pleito.

Tenho como certo que o testamento não pode prevalecer integralmente, porque haveria desrespeito à legítima assegurada por lei à viúva, herdeira necessária que é. E o regime de bens, diferentemente do que alega o inventariante, em nada modifica essa conclusão; como ensina MARIA BERENICE DIAS, “quando o cônjuge é chamado a suceder, assume a condição de herdeiro, independentemente do regime de bens do casamento, pois a lei nada refere ao conferir-lhe a qualidade de herdeiro necessário” – ao contrário do que ocorre, vale frisar, quando dispões sobre o direito de meação. (Manual das Sucessões. São Paulo: RT, 2011, p. 137)

Não menos certo, entretanto, é que o casamento posterior não é causa legal de caducidade do testamento.

A propósito, a lei de regência:

Art. 1.973. Sobrevindo descendente sucessível ao testador, que não o tinha ou não o conhecia quando testou, rompe-se o testamento em todas as suas disposições, se esse descendente sobreviver ao testador.

Art. 1.974. Rompe-se também o testamento feito na ignorância de existirem outros herdeiros necessários.

Como se vê, ao tratar da sobrevinda de herdeiro necessário ‘que não o tinha ou não o conhecia quando testou’ (art. 1.973), o Código Civil delimitou a hipótese de caducidade à classe dos descendentes, não se podendo, destarte, estender o alcance da regra aos demais herdeiros necessários – dentre eles, o cônjuge -, quando o legislador, deliberadamente, pretendeu não fazê-lo. É básico o princípio hermenêutico de que “a lei não contém palavras desnecessárias”.

Da mesma forma, a hipótese do art. 1.974 não se ajusta ao caso dos autos, porque o testador não ignorava a existência do cônjuge, isto é, não incorreu em erro de consciência ao dispor sobre a sua vontade.

A sobrevinda do cônjuge se distancia das causas de caducidade previstas na lei notadamente porque não se submete à cláusula rebus sic stantibus, já que o casamento, como é lógico, não constitui fato imprevisível e extraordinário, a justificar que o raciocínio, aplicável às hipóteses acima, de que ‘se o testador tivesse conhecimento da realidade, teria feito diferente’. No caso do matrimônio, essa presunção não tem razão de existir, inclusive porque, se pretendesse contemplar a nova esposa com a totalidade dos bens que outrora havia assinado à sua irmã, bastava ao autor, simplesmente, ter revogado o testamento, sendo certo que o artigo 1.838 do CC prevê que “em falta de descendentes e ascendentes, será deferida a sucessão por inteiro ao cônjuge sobrevivente.”

A doutrina de MARIA BERENICE DIAS, citando ROLF MADALENO, corrobora esse entendimento:

“… Rolf Madaleno afirma ser uma demasia romper a cédula testamentária em consequência do casamento posterior. Perfeitamente justo é tão só reduzir as liberalidades até o montante da porção disponível. Lembra ser o casamento ato natural da vida e perfeitamente previsível. (…)

A condição de herdeiro necessário do cônjuge sobrevivente impõe que se aplique o instituto da redução das disposições testamentárias (CC 1.966). Perde eficácia a cláusula somente no quanto invadiu a legítima do cônjuge.” (obra supracitada, p. 491, destaquei)

Tem-se, do exposto, que o caso não é de completa ineficácia, mas apenas de redução do testamento até o montante da porção disponível, isto é, até o ponto em que não fira a legítima.

Nessa linha, entendo correta a decisão primeva que entendeu hígido o testamento – já confirmado, inclusive, no âmbito do processo n. 1.0024.12.277117-3 -, mas reconheceu à viúva o direito à parte indisponível do acervo hereditário, correspondente à metade de todo o patrimônio. É o que resulta da redução acima tratada, conforme determina o art. 1.967 do Código Civil:

Art. 1.967. As disposições que excederem a parte disponível reduzir-se-ão aos limites dela, de conformidade com o disposto nos parágrafos seguintes.

Resta, então, analisar a questão do direito real de habitação.

Prevê o art. 1.831 do Código Civil:

Art. 1.831. Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar.

Na decisão agravada, o digno Magistrado reconheceu tal direito à viúva em relação ao imóvel situado na Rua Patagônia, 1023, apto 1104, Sion, à consideração de que “a existência de mais de um bem arrolado nos autos do Inventário, por si só, não exclui o direito real de habitação”, e que, no caso em exame, não há “mais de um bem utilizado para residência da família.”

O agravante, inconformado, alega que existem, sim, outros quatro bens de natureza residencial constantes do inventário, o que afasta – sustenta – a existência do direito real em comento.

E, da atenta análise dos autos, constata-se que, de fato, existe, pelo menos, mais um imóvel de natureza residencial arrolado no inventário, além daquele situado na Rua Patagônia sobre o qual foi reconhecido o direito. Trata-se do imóvel constituído pelo apartamento de n. 401, do Ed. Serra do Curral I, localizado na rua Engenheiro Caetano Lopes, 300, nesta capital, no qual o de cujus comprovadamente residiu até a morte, como demonstram as correspondências de fls. 99/108

(agravo ‘/001’) e a certidão de óbito de fls. 194 (agravo ‘/001’), na qual a própria viúva declarou o referido endereço como sendo a residência do falecido.

Logo, além de não satisfeito o requisito legal de que o bem seja o único de natureza residencial a inventariar, tudo indica que o imóvel indicado pela viúva também não consistia no local de moradia do casal, tendo em vista a documentação acima apontada e a circunstância de que as chaves do apartamento, recém-construído, só foram entregues depois de 03 de agosto de 2012, mês em que o de cujus faleceu (fls. 177, agravo ‘/001’).

E quanto à tese arguida pela agravada de que a existência de mais um imóvel residencial não impede o reconhecimento do direito de habitação, tenho que, não obstante a relevância jurídica dos argumentos que a sustentam, tal exegese não se justifica no caso presente, porque não existem ascendentes nem descendentes e só há mais uma herdeira (testamentária) além da viúva, de modo que, por haver mais de um imóvel residencial, é praticamente certo que esta ficará com um deles, o que lhe assegura uma moradia.

Por essas razões, entendo incabível o direito real de habitação reconhecido à viúva, data maxima venia.

Com essas considerações, DOU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO N. 1.0024.12.282459-2/001, para reformar a decisão no capítulo em que reconheceu a Paula Vilela Ramos o direito real de habitação, E NEGO PROVIMENTO AO RECURSO N. 1.0024.12.282459-2/002.

DES. GERALDO AUGUSTO

DESA. VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE

Comungo da argumentação contida no voto do Em. Relator, Des. Eduardo Andrade, no tocante às preliminares, razão pela qual as rejeito. No mérito, contudo, adiro aos fundamentos contidos no voto do Em. Des. Geraldo Augusto.

Inicialmente, entende-se que devem prevalecer as cláusulas testamentárias em relação aos bens que não adentram a esfera correspondente ao direito de legítima da viúva. Assim, deve ser mantida a decisão de primeiro grau quando deferiu à viúva a parte indisponível do acervo hereditário como herdeira necessária, reduzindo a disposição testamentária a esta proporção, em divisão apenas com a herdeira testamentária, nos termos do voto do Em. Revisor.

Em relação ao direito de meação, há que se destacar o entendimento firmado na Súmula 377 do STF, que dispõe:

STF Súmula nº 377 – 03/04/1964 – DJ de 8/5/1964, p. 1237; DJ de 11/5/1964, p. 1253; DJ de 12/5/1964, p. 1277.

Regime de Separação Legal de Bens – Comunicação – Constância do Casamento

No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento.

Assim, não é necessária a prova de que os bens adquiridos na constância do casamento foram fruto de esforço comum, sendo este presumido. Este também é o entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça:

DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. ALIMENTOS. UNIÃO ESTÁVEL ENTRE SEXAGENÁRIOS. REGIME DE BENS APLICÁVEL. DISTINÇÃO ENTRE FRUTOS E PRODUTO.

1. Se o TJ/PR fixou os alimentos levando em consideração o binômio necessidades da alimentanda e possibilidades do alimentante, suas conclusões são infensas ao reexame do STJ nesta sede recursal.

2. O regime de bens aplicável na união estável é o da comunhão parcial, pelo qual há comunicabilidade ou meação dos bens adquiridos a título oneroso na constância da união, prescindindo-se, para tanto, da prova de que a aquisição decorreu do esforço comum de ambos os companheiros.

3. A comunicabilidade dos bens adquiridos na constância da união estável é regra e, como tal, deve prevalecer sobre as exceções, as quais merecem interpretação restritiva, devendo ser consideradas as peculiaridades de cada caso.

4. A restrição aos atos praticados por pessoas com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos representa ofensa ao princípio da dignidade da pessoa humana.

5. Embora tenha prevalecido no âmbito do STJ o entendimento de que o regime aplicável na união estável entre sexagenários é o da separação obrigatória de bens, segue esse regime temperado pela Súmula 377 do STF, com a comunicação dos bens adquiridos onerosamente na constância da união, sendo presumido o esforço comum, o que equivale à aplicação do regime da comunhão parcial.

6. É salutar a distinção entre a incomunicabilidade do produto dos bens adquiridos anteriormente ao início da união, contida no § 1º do art. 5º da Lei n.º 9.278, de 1996, e a comunicabilidade dos frutos dos bens comuns ou dos particulares de cada cônjuge percebidos na constância do casamento ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão, conforme previsão do art. 1.660, V, do CC/02, correspondente ao art. 271, V, do CC/16, aplicável na espécie.

7. Se o acórdão recorrido categoriza como frutos dos bens particulares do ex-companheiro aqueles adquiridos ao longo da união estável, e não como produto de bens eventualmente adquiridos anteriormente ao início da união, opera-se a comunicação desses frutos para fins de partilha.

8. Recurso especial de G. T. N. não provido.

9. Recurso especial de M. DE L. P. S. provido.

(REsp 1171820/PR, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, Rel. p/ Acórdão Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 07/12/2010, DJe 27/04/2011)

Por fim, mantenho a decisão agravada, ainda nos termos da decisão do Em. Revisor, no que tange à concessão do direito real de habitação à viúva, por considerar que a existência de outros bens residenciais no espólio e ainda não partilhados não pode excluir tal direito. Lado outro, há que se ressaltar que a viúva reside no imóvel situado no Bairro Sion, que lhe foi destinado pela decisão de primeiro grau com base no direito real de habitação, podendo haver posterior compensação dos valores quando da partilha.

Por todo o exposto, data venia do entendimento do Em. Relator, adiro aos fundamentos do voto de divergência do Em. Des. Geraldo Augusto e nego provimento ao recurso 1.0024.12.282459-2/001, para manter o direito real de habitação e a redução do testamento à parte disponível, com o devido reconhecimento do direito à legítima em relação à viúva.

Dou parcial provimento ao presente recurso (nº 1.0024.12.282459-2/002), reconhecendo o direito da viúva à meação dos bens adquiridos na constância do casamento e mantendo o direito real de habitação, nos termos da decisão de primeiro grau.

SÚMULA:”DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO, VENCIDO EM PARTE O RELATOR.”

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