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Alimentos para ex-cônjuge, algumas reflexões

claudiovalentin

A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça acolheu recurso de um homem que buscava interromper pensão paga à ex-mulher por quase 20 anos e entendeu que os alimentos entre ex-cônjuges, salvo em situações excepcionais, devem ser fixados com prazo certo.

A turma reformou acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais que havia mantido o pagamento por entender que, quando do julgamento do pedido de exoneração, a ex-mulher não possuía mais condições de reingresso no mercado de trabalho, pois não tinha adquirido qualificação profissional ao longo da vida.

O relator do recurso especial, ministro Villas Bôas Cueva, lembrou que o entendimento atual do STJ busca evitar a ociosidade e impedir o parasitismo nas relações entre pessoas que se divorciam, especialmente nas situações em que, no momento da separação, há possibilidade concreta de que o beneficiário da pensão assuma “a responsabilidade sobre seu destino”.

Leia a notícia na íntegra.

Para o advogado Rodrigo da Cunha Pereira o assunto é polêmico, pois há situações em que a mulher abandonou a carreira para se dedicar ao lar, dentre outras responsabilidades. “E, assim, o trabalho doméstico, historicamente desenvolvido pelas mulheres, nunca recebeu seu devido valor. Nunca se atribuiu a ele um conteúdo econômico. Entretanto, não é possível a existência de sociedades e famílias sem esse necessário trabalho doméstico”.

Trecho do verbete Alimentos compensatórios do Dicionário de Direito de Família e Sucessões. Saiba mais sobre o livro aqui.

A pensão alimentícia compensatória surge e ganha força no ordenamento jurídico brasileiro em consequência do comando constitucional de reparação das desigualdades entre cônjuges ou companheiros, sob o manto de uma necessária principiologia para o Direito de Família. O desfazimento de um casamento ou união estável, especialmente aqueles que se prolongaram no tempo, e tiveram uma história de cumplicidade e cooperação, não pode significar desequilíbrio no modo e padrão de vida pós-divórcio e pós-dissolução da união estável. As normas jurídicas que dão suporte e autorizam a pensão compensatória, após o fim do casamento ou união estável, advêm dos princípios constitucionais da igualdade, solidariedade, responsabilidade e dignidade humana. As normas infraconstitucionais, mais especificamente o artigo 1.694 do CCB de 2002, bem como a melhor jurisprudência e o direito comparado, apresentam-se também como fontes obrigatórias para a compreensão e desenvolvimento do raciocínio jurídico desta modalidade de pensamento. Nas sociedades capitalistas e patriarcais, é comum atribuir-se valor apenas à força de trabalho que produz mercadorias e rendas. Em outras palavras, atribui-se valor apenas àquilo que traduz um conteúdo econômico.

E, assim, o trabalho doméstico, historicamente desenvolvido pelas mulheres, nunca recebeu seu devido valor. Nunca se atribuiu a ele um conteúdo econômico. Entretanto, não é possível a existência de sociedades e famílias sem esse necessário trabalho doméstico. Mesmo que se delegue a empregados os cuidados e fazeres domésticos, a administração, o cuidado, o olhar, o afeto e a energia ali despendida para que se crie filhos saudáveis, é necessário que, ao menos um dos pais, se dedique mais a essa função. Contudo, como isto não gera renda ou produz dinheiro, tal função ganhou uma importância inferior à de quem trabalha fora de casa. E, assim, a importância e o verdadeiro valor da força de trabalho para a criação e educação de filhos são invisíveis. A pensão alimentícia compensatória se difere da pensão alimentícia comum, em razão da sua natureza reparatória e compensatória de diferenças que vão além da natureza assistencial da pensão alimentícia comum.

O seu fundamento e a sua natureza é a de reparar o desequilíbrio econômico entre os ex-cônjuges, ou ex-companheiros, para que se dissolvam as desvantagens e desigualdades socioeconômicas instaladas em razão do fim da conjugalidade. A pensão alimentícia compensatória pode ter dupla natureza jurídica, que pode demonstrar tanto a necessidade alimentar tradicional quanto na indenizatória no sentido reparatórios das desigualdades dos padrões de vida dos ex-cônjuges. E, como natureza reparatória, não se pode atrelá-la à responsabilidade subjetiva, pois não está a procurar um culpado pelo fim do casamento/união estável, até porque não há. Aliás, não se está a falar em momento algum de culpa, mas tão somente de responsabilidade.

Daí poder-se afirmar que estamos diante de um típico caso de responsabilidade civil objetiva decorrente de uma relação contratual, seja casamento ou união estável (art. 927, CCB). A obrigação alimentar compensatória se extingue com a morte do alimentário ou com a ausência de necessidade compensatória, seja em razão de abrupta queda da possibilidade do alimentante, seja pelo repasse integral de numerário, tornando-se isonômicas as realidades, ou mesmo pela desnecessidade do alimentário decorrente de fator superveniente ao padrão posto em análise no momento da fixação.

Leia também “Alimentos compensatórios nem só de pão vive o homem” aqui.

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