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IBDFAM completa 23 anos; fundadores apontam avanços na trajetória e desafios em meio à pandemia

Ascom

O Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM completou 23 anos de fundação no último domingo, 25 de outubro. O aniversário em meio à pandemia do Coronavírus suscita reflexões não só sobre os avanços conquistados ao longo dessa trajetória, mas também sobre os novos desafios que surgem neste momento de excepcionalidade.

“Estamos sendo obrigados a nos depararmos com nós mesmos e com o outro, já que tem sido inevitável viver sob o mesmo teto neste momento, para o bem e para o mal. Nossa rotina foi virada de cabeça para baixo, o que traz grandes repercussões ao Direito de Família e Sucessões”, observa o advogado Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do IBDFAM.

Segundo o jurista, neste 23º aniversário do Instituto, as famílias se encontram em teste de tolerância, compreensão e compaixão. “No silêncio deste enclausuramento nos deparamos com nossa finitude, nossos desejos mais indesejáveis, inquietações e desamparo. É também tempo de espera de uma vida com novos valores éticos. É nessa eticidade que o IBDFAM se faz presente.”

“A espera, mesmo forçada, serve para sublimar o desejo e torná-lo mais poderoso e determinante. A intolerância e incompreensão já foi parar nas barras dos tribunais para suspender ‘visitas’ de filhos de pais separados. Isso demonstra que o modelo de convivência familiar, tal como praticado, está em xeque, pois, de fato, a cultura da guarda compartilhada ainda não foi implementada no Brasil, devendo ser aplicada a possibilidade com alternância de residência”, reflete Rodrigo.

Rolf Madaleno, Giselda Hironaka, Rodrigo da Cunha Pereira e Paulo Lôbo em solenidade no II Congresso Brasileiro de Direito de Família e Sucessões (Foto: Acervo IBDFAM)

Partes de um sonho delirante

Vice-presidente do IBDFAM, a advogada Maria Berenice Dias afirma que o Instituto mantém um convívio de natureza afetiva entre os milhares de associados. “Não é por outro motivo que nos identificamos por ibedermanos, mas por fazermos parte desse grande sonho delirante que começou há 23 anos e que continua com os mesmos ideais”, aponta.

Ela nega que a quarentena tenha imposto aos membros um isolamento, afinal, o IBDFAM continuou atuante e estreitando laços diante desta nova realidade. “Creio que conseguimos nos aproximar mais de pessoas e de locais que às vezes eram inacessíveis. Muitos de nós, que passamos pelo país sacudindo nossas bandeiras na busca da sensibilização de quem trata do Direito das Famílias, não conseguíamos dar conta de ir a tantos lugares e falar a tantas pessoas.”

“Não estamos viajando, mas confesso que nunca ‘viajei’ por tantos lugares como agora. Assumimos o compromisso de continuar falando, mostrando o que é o IBDFAM, com um trabalho significativo de capilarização das nossas ideias, porque não é fácil mudar uma sociedade ou apresentar as coisas sob uma outra ótica”, acrescenta Maria Berenice.

Segundo a vice-presidente do Instituto, advém desse diálogo os méritos e conquistas do IBDFAM em seus 23 anos. “Precisamos chegar a todos os ouvidos e sensibilizar muitos corações e almas. Conseguimos seguir assim na pandemia. Tem sido um grande ganho conseguir levar nossas ideias e sonhos a todos os rincões deste país”, avalia.

Debates se intensificaram durante confinamento

Cofundador e atualmente diretor da regional Nordeste do IBDFAM, o advogado Paulo Lôbo observa que, paradoxalmente, a pandemia suscitou intenso debate on-line, aproximando estudiosos e profissionais, ainda que confinados em suas casas. O IBDFAM nacional, bem como comissões, regionais, seções estaduais e núcleos, participa deste fenômeno por meio de lives, eventos e reuniões.

“A maior contribuição tem sido relativamente à aplicação do Direito transitório a essas circunstâncias excepcionais, inclusive com uso de institutos permanentes do Direito que possam ser respostas adequadas, além da legislação especial”, aponta Paulo. Ele não perde de vista, contudo, as controvérsias presentes do ciberespaço.

O jurista lembra um ensinamento do escritor e filósofo Umberto Eco (1932-2016): a internet deu voz ao idiota de aldeia, cujas manifestações irracionais não ia além dela, o que reduzia sua nocividade. “Com a mídia social, qualquer discurso irracional, regressivo e ofensivo alcança proporções e danos impressionantes.”

“O Direito de Família não escapa dessa fúria discursiva, pois lida com situações existenciais, que são alvos fáceis a tais intentos. Cada um tem um modelo de família que deseja impor a todos. O direito é a cidadela da cidadania contra essas virulências e para assegurar a igualdade, a liberdade e o respeito à diversidade”, defende Paulo.

O jurista Paulo Lôbo, cofundador do IBDFAM, em palestra no II Congresso Brasileiro de Direito de Família e Sucessões (Foto: Acervo IBDFAM)

Combate à intolerância

O advento digital, ao mesmo tempo em que nos aproximou diante da necessidade de distanciamento físico, também tem o poder de dar voz a discursos de ódio. Para Rodrigo da Cunha Pereira, o Direito “é um importante instrumento de inclusão ou exclusão das minorias no laço social. A intolerância e incompreensão sempre existiram e precisam ser combatidas com valores humanitários e fraternos. Na era digital, apenas se aflorou aquilo que muitas pessoas já tinham dentro de si”.

O IBDFAM, segundo seu presidente, esteve presente nas respostas efetivas e históricas do Poder Judiciário a esse fenômeno, como a decisão da criminalização da homofobia pelo Supremo Tribunal Federal – STF, em 2019 (ADO 26 e MI 4733), e a efetivação e aplicabilidade da Lei Maria da Penha (11.340/2006), em 2012 (ADC 19), em constante atualização legislativa, solidificando valores humanitários e de proteção aos vulneráveis.

A pandemia também impôs avanços ao sistema de justiça, a exemplo do Provimento 100/2020, expedido em maio pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ, que dispõe e autoriza a prática de atos notariais eletrônicos utilizando o sistema e-Notariado. Facilitou, por exemplo, os divórcios, que passaram a ser feitos eletronicamente e por vídeoconferência.

Um dos principais desafios é acertar o Poder Judiciário com a sociedade digital, permitindo maior celeridade e efetividade à Justiça. “Essa realidade precisa ser implementada na prática, não só no papel. Talvez seja esse um dos grandes desafios, aliado ao questionamento da cultura adversarial da advocacia. Agora, mais do que nunca, ela se encaminhará cada vez mais para a cultura da prevenção e em busca de novos métodos de resolução de conflitos.”

Crianças Invisíveis

Entre os principais desafios pela frente, Maria Berenice destaca a luta pelas crianças em acolhimento. “No momento, o grande projeto do IBDFAM é o Crianças Invisíveis. Ainda não conseguimos reverter a situação perversa de que são vítimas essas crianças que estão institucionalizadas.”

A especialista aponta os caminhos possíveis para a superação dessa realidade. “É preciso mudar a mentalidade das pessoas sobre o tema e alterar profundamente o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, ainda ligado a um biologismo de quando foi editado, há 30 anos.”

Segundo a advogada, crianças à espera de um família, sem perspectivas de serem adotadas, estão privadas de direitos básicos garantidos pela lei. “Esse é o maior crime produzido pela nossa sociedade com relação a essas crianças que têm direito à convivência familiar dentro de um conceito de família atual. Essa é a nossa primeira grande meta neste novo ano que se inicia da nossa existência”, destaca Maria Berenice.

Marcelo Leonardo, Francisco Figueiredo, Rodrigo da Cunha Pereira, Maria Berenice Dias e Luiz Carlos Machado em solenidade no II Congresso Brasileiro de Direito de Família e Sucessões
(Foto: Acervo IBDFAM)

Próximos passos

Para Paulo Lôbo, o objetivo à diante é “manter o rumo e os propósitos que o animaram e o animam o IBDFAM desde sua fundação em 1997”. Agora, sua atuação é mais necessária do que antes, segundo o advogado.

“Nestes 23 anos, o IBDFAM consolidou sua maturidade institucional, com amplo reconhecimento da comunidade jurídica e da administração da justiça. Com respeito à pluralidade de opiniões dos que o integram, tem participado intensamente com seus estudos especializados dos avanços e mudanças que ocorrem nas relações jurídicas e sociais das famílias brasileiras e do Direito das Sucessões”, avalia.

O principal desafio, de acordo com o cofundador, é “manter essa trajetória bem-sucedida de congraçamento dos especialistas e de contribuição qualitativa e técnica nessas áreas tão sensíveis à polarização ideológica acentuada que estamos a vivenciar na atualidade. Visões moralistas e religiosas extremadas têm procurado interferir na legislação e na aplicação do direito para que seus valores particularizados prevaleçam sobre o conjunto da sociedade.”

Maria Berenice Dias garante: “Se durante estes 23 anos, o IBDFAM provocou uma enorme e significativa transformação no âmbito do Direito das Famílias, a ponto de pluralizar a forma de se identificar esse ramo do Direito, esgarçando esse conceito fechado de família para a realidade da vida como ela é, no período que se segue agora não vamos abandonar nossos ideias de continuar lutando por uma justiça e uma resposta estatal mais rente à realidade da vida”.

Ela prevê a busca por concretização, no Poder Legislativo, das mudanças e dos avanços obtidos nas últimas décadas, a exemplo do reconhecimento da multiparentalidade, da responsabilidade por abandono afetivo e da filiação socioafetiva equipada ao vínculo biológico. “Temos que mudar a lei, até a Constituição da República. Esse será um dos grandes desafios para os próximos anos”, crava.

Novos tempos

Segundo Rodrigo da Cunha Pereira, o Direito de Família e os instrumentos processuais utilizados precisam ser renovados e atualizados para se adaptarem aos novos tempos. “Precisamos repensar alguns paradigmas. Podemos também buscar na Psicanálise ajuda para compreender e desenvolver melhor nosso trabalho”, avalia.

“Estas mudanças devem começar, antes dos instrumentos processuais, pelos próprios profissionais, quando começaremos a considerar o discurso inconsciente que ‘revela’ o algo mais de que tanto necessitamos para desempenhar melhor e mais eticamente nossas funções”, pontua o advogado.

Neste 23º aniversário, o presidente do IBDFAM cita os versos de Fernando Brant, Márcio Borges e Milton Nascimento, imortalizados na voz de Elis Regina, da canção O Que Foi Feito Devera (De Vera): “Se muito vale o já feito, mais vale o que será”.

Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM

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